segunda-feira, 23 de abril de 2012

Não à violência sexual contra crianças e adolescentes

O CLADEM/Brasil - Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher - vem a público manifestar seu repúdio e indignação pela postura machista, discriminatória e atentatória aos direitos humanos de meninas e mulheres adotada recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça, ao inocentar um acusado de estuprar três meninas de 12 anos de idade, mediante o fundamento de que as crianças já “se prostituíam há tempos”, sendo inaplicável a presunção de violência prevista pelo Código Penal.

Embora o acórdão esteja protegido por segredo de justiça, os trechos que foram publicizados indicam uma postura preconceituosa e discriminatória e, portanto, inadmissível, por parte dos magistrados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo divulgado, o crime de estupro não teria ocorrido, com base nos seguintes argumentos:

“Com efeito, não se pode considerar crime fato que não tenha violado, verdadeiramente, o bem jurídico tutelado – a liberdade sexual –, haja vista constar dos autos que as menores já se prostituíam havia algum tempo”, concluiu a relatora.

“A prova trazida aos autos demonstra, fartamente, que as vítimas, à época dos fatos, lamentavelmente, já estavam longe de serem inocentes, ingênuas, inconscientes e desinformadas a respeito do sexo. Embora imoral e reprovável a conduta praticada pelo réu, não restaram configurados os tipos penais pelos quais foi denunciado", afirmou o acórdão do TJSP, que manteve a sentença absolutória.

É inadmissível que, em pleno século XXI, inquirições sobre a vida privada e a conduta sexual das vítimas de crimes sexuais sirvam de preconceituosas balizas para justificar crimes injustificáveis e responsabilizar as vítimas pelas violências sofridas.

Vale lembrar, nesse contexto, que o núcleo do tipo penal em questão apresenta como fundamental para a configuração do crime o dissenso da vítima em relação à prática de atos sexuais. Ou seja, pouco importa se a vítima é solteira ou casada, tem vida sexual ativa ou não, está envolvida com a prostituição ou qualquer outro aspecto. O que se mostra relevante para a configuração do  tipo penal é apenas o não consentimento da vítima, caso em que  não há crime e não há que se investigar nada em relação à vida privada das vítimas.

Como agravante, tem-se  a questão de que as vítimas eram crianças à época dos fatos, o que evidencia que estarem já inseridas na prostituição apenas demonstra sua vulnerabilidade e reiterada violação de direitos. Por encontrarem-se em um peculiar processo de desenvolvimento biopsicológico, as meninas são titulares da proteção integral, com prioridade absoluta definida pela Constituição Federal (artigo 227) e detalhada no Estatuto da Criança e do Adolescente. A situação de marginalização em que já se encontravam – com apenas 12 anos de idade – deveria reforçar a necessidade de serem acolhidas e protegidas, e não responsabilizadas mais uma vez pelas violências sofridas.

Os trechos dos acórdãos do TJSP e do STJ, publicados em 27.03.2012, assustam por ser o posicionamento daqueles que deveriam zelar pela justiça e pelos direitos humanos de meninas e mulheres.

Além disso, significam uma ofensa às normas nacionais e internacionais de proteção aos direitos humanos, em clara afronta à Constituição Federal e aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil, em especial a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW).

É urgente que posicionamentos como estes sejam prontamente revertidos e que todos os integrantes das diversas instâncias do poder judiciário brasileiro tenham acesso a formações específicas em gênero e direitos humanos, como determinam recomendações do Comitê CEDAW ao Brasil, para que absurdos como estes não se perpetuem em nossa sociedade, reiterando práticas machistas, discriminatórias e violadoras de direitos fundamentais.

20.04.2012

Está na hora!  É o momento!!

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