Com este Estatuto, os conceitos ideológicos e anti-científicos de 'situação irregular' e o termo estigmatizador de 'menor' com sentido pejorativo e marginalizador ficaram definitivamente revogados. As disposições finais e transitórias normatizam a aplicação do diploma legal, definindo estrutura e mecanismos para a sua concretização. O menor carente, abandonado e infrator é fruto da nossa sociedade, pelas diferenças entre a classe rica e a pobre. A Folha de São Paulo do dia 11 de julho de 1990 publicou que 81,5% da população economicamente ativa percebe renda mensal de até 5 salários mínimos, sabendo que existe aproximadamente 57 milhões de crianças e adolescentes entre 0 e 18 anos (improdutivos), não existe qualquer possibilidade de haver equilíbrio social. Portanto, a sociedade também possui uma parcela de responsabilidade na tutela à criança e ao adolescente. O Estatuto fixou a adolescência aos 12 anos completos, no entanto, as regras mínimas que as Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores recomenda é que nos sistemas jurídicos que reconheçam o conceito de responsabilidade penal para menores, seu começo não deveria fixar-se numa idade demasiado precoce, levando em conta as circunstâncias que acompanham a maturidade emocional, mental e intelectual. PESSOAS FÍSICAS E JURÍDICAS OBRIGADAS ÀS PRESTAÇÕES DEVIDAS AOS MENORES, PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E PELO E.C.A. O art. 6º do ECA é claro ao preceituar que a criança e o adolescente são pessoas em desenvolvimento e deve-se sobrelevar a proteção aos interesses do menor sobre qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado, devendo ele ser ouvido sempre sobre sua situação ou seu próprio destino, quando estiver em condições de ser ouvido, não se compreendendo qualquer decisão que seja tomada contrariamente aos seus interesses. No entanto, as declarações do menor, embora de grande valia, devem ser analisadas com cautela, pois podem estar sob influência de seus responsáveis e nem sempre entendem o que melhor lhes convém, portanto, deve ser decidido judicialmente, com o auxílio da equipe interdisciplinar. A Jurisprudência sempre reconheceu que o interesse do menor deve prevalecer sobre qualquer outro, quando seu destino estiver em discussão. Mesmo o adolescente infrator deve merecer tratamento tutelar, de modo que venha a ser uma pessoa integrada à sociedade. O menor perigoso deve receber tratamento adequado em algum estabelecimento específico, ficando internado, vez que sua conduta demonstrou periculosidade com seu ato infracional de natureza grave, ou sua reincidência comprovada. Evaristo de Moraes afirma que: "... aumenta a criminalidade da infância e da adolescência, revelando-se, dia-a-dia, mais precocemente os impulsos anti-sociais." PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS O ECA é regido por uma série de princípios que representam a nova política estatutária do direito da criança e do adolescente. Tais conceitos servirão de orientação ao intérprete, sendo os principais os seguintes: 1) Princípio da prevenção geral: É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente as necessidades básicas para seu pleno desenvolvimento (art. 54, I a VIII) e prevenir a ocorrência de ameaça ou violação desses direitos (art. 70).; 2) Princípio da prevenção especial: o Poder Público regulará, através de órgãos competentes, as diversões e espetáculos públicos (art. 74); 3) Princípio de Atendimento Integral: o menor tem direito à atendimento total e irrestrito (vida, saúde, educação, esporte, lazer, profissionalização, etc) necessários ao seu desenvolvimento (arts. 3º, 4º e 7º, do ECA); 4) Princípio da Garantia Prioritária: Tem primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, assim como formulação e execução das políticas, sociais, públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude (art. 4º, a,b,c,d); 5) Princípio da proteção estatal: visa a sua formação biopsíquica, social, familiar e comunitária, através de programas de desenvolvimento (art. 101); 6) Princípio da prevalência dos interesses a criança e do adolescente, pois na interpretação do estatuto levar-se-ão em conta os fins sociais a que ele se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento (art. 6º); 7) Princípio da indisponibilidade dos direitos: pois o reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercido contra os pais, ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de justiça (art. 27); 8) Princípio da sigilosidade: sendo vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional; 9) Princípio da gratuidade: pois é garantido o acesso de toda criança e adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos, sendo a assistência judiciária gratuita prestada a todos que a necessitem (art. 141, §§ 1º e 2º ). DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS Do direito à vida e à saúde "'A vida é realmente o único bem que a pessoa tem', já que os demais virão por acréscimo." A vida e a saúde também são consideradas direitos fundamentais da criança e do adolescente, já que estão em fase de desenvolvimento, devendo existir programas assistenciais que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência, assegurando à gestante, à parturiente e à nutriz (mulher que amamenta) todas as condições necessárias. Quando ocorrer suspeita de maus tratos (art. 13), deve-se comunicar imediatamente o Conselho Tutelar (art. 131), órgão constituído por cidadãos eleitos em cada município que deverá ter um importante papel na proteção ao menor, pois esse Conselho que irá tomar as providências cabíveis em cada caso. Liberdade, Respeito e Dignidade O direito à liberdade é bastante amplo, mas sempre deve-se ter em vista a segurança da criança e do adolescente, e, por esse motivo, é que existem certas restrições e limites. As crianças e adolescentes devem respeitar os outros indivíduos, principalmente os idosos, da mesma forma que merecem o respeito de todos. Convivência Familiar e Comunitária Pela regra geral acredita-se que a família, de direito ou de fato, é o lugar ideal para a criação e educação da criança e do adolescente. E isto porque os pais são os maiores responsáveis pela formação dos filhos, possuindo o poder sobre eles e o dever de lhes garantir os direitos fundamentais. A Constituição da República igualou o poder familiar, portanto, ele será exercido igualmente pelo pai e pela mãe. Qualquer divergência entre eles poderá ser resolvida em juízo. A legislação penal prevê crimes contra a assistência familiar (arts. 244, 246, 247 e 245) visando tutelar o menor de 18 anos. Em casos excepcionais o menor deverá de idade ser colocado em família substituta. A perda ou suspensão do poder familiar só deve ocorrer nos casos em que a família natural se desinteresse ou abandone o filho. Essa perda ou suspensão somente poderá ser decretada judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na lei. Família Natural: é a comunidade formada pelos pais, ou qualquer um deles e seus descendentes. Família Substituta é aquela que recebe o menor em guarda, tutela ou adoção. A família substituta estrangeira é uma medida que deve ser tomada excepcionalmente, sendo admissível apenas na modalidade de adoção. Os filhos havidos fora do casamento podem ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente; no próprio termo de nascimento; por testamento; mediante escritura; mediante outro documento público. Vale lembrar que qualquer que seja a origem da filiação, os filhos podem ser reconhecidos, ou seja, pouco importa o estado civil dos pais. O direito ao estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível. A guarda visa regularizar a posse de fato da criança. É a primeira forma de colocação em família substituta ou associação até que se torne definitivo. Poderá ser revogada a qualquer tempo mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público. A tutela é uma instituição legal destinada à proteção de menores órfãos, que não possam dirigir suas pessoas ou bens, por si sós, precisando de tutor. Existem três formas de tutela: testamentária (por ato de última vontade), legítima (decorre da lei e cabe aos parentes) e dativa (deriva de sentença judicial). O artigo 409, do Código Civil estabelece uma ordem determinada para a nomeação de tutor, mas não é rígida, porque visa o interesse do menor (RT, 614:56; 566:56). A adoção é o instituto que tem sido utilizado desde a antigüidade, pois trata-se de meio pelo qual o casal sem filhos consegue assegurar a continuidade de sua descendência, recebendo um estranho na qualidade de filho. PREVENÇÃO Visto que é dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação de direitos, ninguém pode eximir-se desta obrigação. O descumprimento das normas de prevenção, sujeita os responsáveis (pessoa física ou jurídica) à obrigação de reparar o gravame ocasionado, por ação ou omissão, sem prejuízo da responsabilidade penal. PROTEÇÃO As medidas de proteção devem ser aplicadas pelo Conselho Tutelar ou pela autoridade judiciária, e devem sempre buscar os fins sociais a que se destinam, conforme o art. 6º do ECA, levando em consideração o universo bio-psicossocial que vivem. As medidas específicas de proteção aplicam-se: 1) às crianças e adolescentes carentes (art. 98, I e II, c/c artigo 136, I, ambos do ECA); 2) às crianças e adolescentes infratores (art. 98, III, c/c 6s art5g6s 105; 112, VII e 136, VI, todos do ECA). O Conselho Tutelar, órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, terá atribuição para aplicar as medidas específicas de proteção às crianças e aos adolescentes carentes e às crianças infratoras (arts. 136, I, c/c artigo 98 e seus incisos e art. 105, todos do Estatuto). O juiz da infância e da juventude tem competência para administrar privativamente as medidas de proteção aos adolescentes infratores e conforme dispõe o artigo 126, ECA, conhecer da problemática e administrar tudo o que é da competência do Conselho Tutelar, enquanto este não é criado. 8 . Infancia abandonada e Estado de Bem-Estar no Brasil: de menor marginalizado a meninos e meninas de rua. O Texto não informa a autoria. Refere-se ao período do Welfare state, do Estado de segurança, e a visão sobre a infância e adolescência no Brasil. No geral, a implantação do chamado Welfare State (Estado do Bem Estar Social) levou à necessária adaptação das estruturas assistenciais a partir de um processo de desenvolvimento capitalista excludente pós-Segunda Guerra Mundial; desenvolvimento, naqueles momentos, seriamente questionado pelas forças políticas dos países comunistas e pressionado pelos grupos e partidos de esquerda nacionais desejosos de revoluções socialistas. Esses fatos sociais passam a ser oficialmente explicados por meio de um discurso estrategicamente crítico, recheado, paradoxalmente, por práticas assistenciais levadas a cabo por instituições tradicionalmente autoritárias. Esse discurso, possivelmente, leva a acreditar que o real sentido do Estado de Bem-Estar Social implantado no Brasil, e na América Latina, seja o de se converter, no terreno prático, em um "Estado de Bem-Estar estatal. Processo que ideologicamente termina por exigir uma forma mais democrática de conceituar a infância abandonada e marginalizada no Brasil, o qual radicalizado durante os anos de 1980 por movimentos sociais politicamente organizados, quando da abertura do Estado Ditatorial brasileiro, leva a uma nova forma de conceituar e de trabalhar com essa infância, denominada agora como Menino de rua. Devia o Estado democratizar-se abrindo suas instituições à participação da sociedade civil organizada, com vistas a amenizar os efeitos colaterais de uma suposta modernização ou progresso social, já que os prognósticos, desde os bastidores da ditadura militar brasileira, indicavam que o impacto dessa forte mudança causaria inumeráveis conflitos políticos e desajustes sociais.
No caso brasileiro, essa forma de Estado, teve por base um contexto político ditatorial, levando os governantes militares, frente à necessidade de modernizar a economia, a uma conclusão inevitável: dever-se-ia centralizar o poder político, a fim de dar segurança política às mudanças proporcionadas evitando que tais transformações resultassem em um descontrole social. Tal modelo de Estado à brasileira (e por extensão a la latinoamerica), chamado de "desenvolvimento com segurança nacional" (Passetti, 1996, p. 161), foi a fórmula encontrada para um sistema social que deveria industrializar-se abrindo instituições e discursos sociais, evitando, ao mesmo tempo, que os conflitos, gerados ou acirrados, desembocando em revoltas radicais. Portanto, centralizado o poder político de modo autoritário, inicia-se o chamado processo de desenvolvimento com segurança. Com isso, as mudanças socioeconômicas de modernização do país aprofundam-se, ocasionando a iminente necessidade de reformas nas políticas assistenciais em prol de uma efetiva conformação do “welfare state”. O menor visto como foco de conflito, descontrole social e/ou político, requereu, de parte dos governos ditatoriais brasileiros, lançar mão de um trabalho preventivo. Nesse caso, a prevenção consistia na adoção de um conjunto de medidas legislativas, administrativas e políticas, visando, antes de tudo, apartar esse menor das causas exteriores de sua marginalização (a rua e os lares desequilibrados); bem como afastá-lo de um possível contato com os inimigos invisíveis da nação, configurados pelas drogas e pelas idéias comunistas. Para tanto, o Estado ditatorial brasileiro, busca adaptar sua política de atendimento à infância abandonada às novas normativas internacionais estabelecidas na Declaração dos Direitos da Criança de 1959 da ONU.
A Funabem, se consagra então, como entidade administrativa e financeiramente autônoma, diretamente ligada à Presidência da República com exclusiva competência para definir, implantar e fiscalizar a chamada Política Nacional de Bem-Estar do Menor -- PNABEM (3). Consubstanciando-se, portanto, em uma instituição com poderes de regulação nacional, a qual, mais que financiar projetos públicos e privados, inaugura no plano teórico, mutatis mutantis, uma nova política de atendimento para a infância abandonada, ao mesmo tempo, que manteve tradicionais práticas repressivas assistenciais.
O menor, agora entendido como menor marginalizado, visto como sujeito passivo de um desajuste social merece uma assistência social mais humanizada para a sua recuperação, a qual deveria ser levada a cabo por um atendimento calcado em um saber especializado e técnico. A Funabem, no entanto, encarregava-se de estudar e investigar o problema do chamado menor marginalizado: planejando, orientando e apresentando modelos de atendimento. Mobilizava a opinião pública e oferecia, ao mesmo tempo, assistência técnica aos diversos Estados, ao formar, treinar e aperfeiçoar o quadro técnico das instituições estaduais. A Funabem desenvolveu uma política de aproximação e de expansão de seu modelo com os governos estaduais no sentido de inculcar-lhes sua ideologia e sua metodologia de atendimento. Dessa aproximação, em 1971/1972, começa a surgir a Febem (5) -- Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor, possibilitando que cada Estado da federação criasse diretamente sua instituição de atendimento ao menor, responsável, segundo Adorno (1993, p. 108), pela implantação das diretrizes da Funabem nos Estados.
Com um discurso mais aberto estabelecia que a marginalização e, a solução do problema do menor, não se tratava de um problema de eugenia da raça (discurso comum de finais do século XIX até o final da Segunda Guerra Mundial); mas tratava-se de um problema social gerado em razão das novas e necessárias políticas de reajuste econômico em busca de modernização. A política de bem-estar proposta à questão do menor marginalizado estabelecia que a internação não se daria sem antes observar, rigorosamente, a escala fixada pelo Conselho Nacional da Funabem, de acordo com os incisos I, II e III do Artigo 6 das diretrizes da PNABEM (Rizzini, 1995, p. 151), estabelecendo como prioridade a efetivação de programas de integração do menor a sua comunidade de origem, e não a internação em instituições fechadas. Historicamente, a Funabem, conformou-se eminentemente enquanto instituição de controle social, incidindo, de modo duro, no controle de centenas de milhares de menores marginalizados componentes da pobreza juvenil.
Desde princípios dos anos de 1970, o discurso de que se deveria reformar o Código do Menor de 1927 foi ganhando notoriedade e adeptos, a fim de que se buscassem melhores meios para prevenir ou corrigir as causas da marginação juvenil. Ao final, a dita reforma realizou-se em 1979, sob a alegação de se comemorar o Ano Internacional da Criança, celebrado naquele ano. O novo Código do Menor, reformulado em 10 de outubro de 1979, instituído pela Lei no. 6.697, resultou de um anteprojeto apresentado pela Associação Brasileira de Juízes de Menores e seguia as tendências da Associação Internacional de Juízes de Menores. Código que reafirmou de modo expresso a chamada Doutrina Jurídica da Situação Irregular, dedicada a regulamentar o controle sociodisciplinar, levado a cabo por instituições fechadas de disciplina e correição (7). Definia, assim, seu artigo 2, parágrafos V e VII, a irregularidade enquanto um mero desvio de conduta ou quando incidisse em uma infração penal.
Segundo Vogel (1995), a Funabem, naquele momento, definia os menores marginalizados como pessoas compreendidas dentro de um processo de distanciamento progressivo das normais etapas de desenvolvimento e promoção humana, até chegar à condição de abandono, de exploração e de condutas anti-sociais, razão pela qual os classificou em dois tipos diferentes de categorias: o menor carente definido como os menores cujas necessidades básicas não estavam sendo atendidas por ausência ou incapacidade dos pais ou responsáveis, encontrandose em situação de abandono ou na condição de vítima de alguma exploração infantil, e o menor de conduta anti-social definido como aquele que infringe normas éticas ou jurídicas da sociedade.
Guirado (1980) afirma que o menor como vítima do abandono dos pais, da fome, do analfabetismo, da violência policial, da incompreensão dos adultos, da falta de preparação profissional e da dissolução da família não deveria nem poderia ser castigado; por tratar-se de uma vítima da nova, moderna e desumanizada sociedade de consumo, deve ser cuidado e não penalizado.
Diante dessa realidade, estava criada uma nova forma de conceber o menor, uma concepção na qual o menino, menina ou adolescente era tido como vítima do progresso urbano e tecnológico que os transformou em marginalizados. Mas o interessante a ser destacado aqui é que esse discurso socialmente mais crítico, formulador do conceito de menor marginalizado, levado a cabo por representantes da ditadura militar, num primeiro momento, foi ideologicamente aplicado como um modo de camuflar as duras práticas autoritárias ditatoriais refletidas diretamente na assistência social; num segundo momento, tal discurso, à revelia do regime militar, radicaliza-se desdobrando-se em um novo conceito, o de meninos e meninas de rua enquanto categoria de análise de uma realidade social e econômica. O termo Menino de Rua, segundo diversas fontes historiográficas, entre elas Impelizieri (1995), a princípio foi usado por dois autores brasileiros, Ferreira e Gonçalves, cujas obras, publicadas em 1979 , criticavam os conceitos de menor e de menor abandonado. Sabemos que, a partir de anos de 1980, a ditadura militar brasileira perdia força e hegemonia, em parte por não mais existir o contexto político que a justificou.
Diversos grupos dedicados à questão da infância se articularam com outros movimentos dedicados à implementação de novas políticas públicas pela qual radicalizaram a idéia de que havia uma marginalização social do menor, passando a reivindicar novas respostas à problemática. Dentre as organizações surgidas, destaca-se o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua -- MNMMR, criado no ano de 1985, que passa a exercer vanguarda nesse processo de mudança conceitual e de formulação de novas políticas de atendimento, consubstanciado na chamada Doutrina da Proteção Integral à Infância e Adolescência. Igualmente, merece destaque a Pastoral do Menor, criada em 1977. Ainda que atuando como uma importante instituição social de apoio às novas políticas de proteção integral à infância e adolescência demandadas pelas organizações populares, dentro desse processo de reconceitualização da infância marginalizada, essa organização não exerceu papel político de vanguarda tão direto, em comparação com o citado MNMMR. A Pastoral do Menor foi, sem dúvida alguma, a instituição que mais disseminou o uso do termo Meninos de Rua, que, popularizado durante os anos de 1980, levou ao conhecimento público as reais condições de marginalização do chamado menor; com isso, gerou a principal base para que o termo Menino de Rua se firmasse e prevalecesse como nova categoria de análise.
Esse processo se evidencia na Campanha da Fraternidade de 1987, organizada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil -- CNBB, que tratou da questão do menor aplicando o conceito de Meninos de Rua.
Em resumo, a Campanha da Fraternidade de 1987, partindo de uma análise mais radical das injustas estruturas econômicas e da degradação cultural e ética da sociedade, chegou a criticar duramente a Febem, ao mesmo tempo em que promovia positivamente as atividades do MNMMR.
Graficamente, o processo da marginalização social foi representado pela CNBB, no Manual da Campanha da Fraternidade (CNBB, 1987, p. 225) denominado Quem acolhe o menor a mim acolhe (Evangelho de São Marcos 9, 37): 1- Desestruturação da economia rural; 2- O engano de uma boa vida na cidade, com o conseqüente êxodo rural e o crescimento da pobreza nos bairros urbanos; 3- As milhares de famílias empobrecidas não podiam dar os cuidados necessários à gravidez e aos recémnascidos, provocando-lhes danos físicos e psicológicos irreparáveis; 4- Empobrecimento dos meninos e adolescentes; 5- O surgimento dos meninos na rua; 6- As injustas e duras experiências destes, com as instituições e sociedade; 7- A delinqüência juvenil. A nova expressão Meninos e Meninas de Rua, uma vez consolidada na realidade assistencial brasileira, viu-se exportada para o mundo como uma categoria de análise que rompia com a citada noção bicéfala da Cultura Menorista. Não tardou em transformar-se em conceito referencial básico à nova Doutrina Jurídica de Proteção Integral a Infância, a qual, inaugurada pela ONU em 1989, mediante a Convenção dos Direitos da Infância e Adolescência, revogou a citada Cultura Menorista, bem como sua Doutrina Jurídica da Situação Irregular. Referendando, no Brasil, a aprovação do Estatuto da criança e do adolescente -- ECA, em 1990, o qual efetiva juridicamente a idéia de que criança, independentemente de ser pobre ou não (criança ou menor), é sujeito e não objeto de direitos: devendo ser, portanto, integralmente respeitada a fim de que sua condição de pessoa humana em desenvolvimento seja garantida de modo amplo e efetivo.
10. Perspectiva jurídica das raízes históricas dos direitos da criança e do adolescente
O texto versa sobre direitos fundamentais, inalienáveis, indisponíveis, imprescritíveis, que devem ser promovidos e garantidos, em outras palavras, postos a salvo de qualquer relativização ou retrocesso. Neste sentido, será abordado o surgimento do sentimento de infância e as raízes históricas dos Direitos da Criança e do Adolescente na Europa e no Brasil, assim como o seu reconhecimento enquanto ramo autônomo da ciência jurídica – de caráter interdisciplinar –, e as implicações que a partir desse processo surgem no horizonte jurídico-institucional do Brasil. Trata-se, em resumo, de lançar um olhar em direção ao passado para melhor se compreender o presente. 11. Uma visão crítica da política do menor Além de situar como e por que as políticas oficiais de atendimento aos menores não conseguem beneficiar este segmento da população brasileira, o psicólogo Benedito Adalberto Boletta de Oliveira, com base em quase 10 anos de experiência como técnico em órgãos de atendimento de menores, sugere também algumas alternativas de intervenção tanto em termos de atendimento direto quanto de compreensão dos problemas vividos pelos menores num contexto estrutural de pauperização da população brasileira. Ele resgata um histórico sobre as políticas baseadas na minoridade. Fala, principalmente, da FUNABEM, que foi largamente abordada no texto anterior. 12. O sistema de garantias dos direitos da criança e do adolescente
Apresentação em Power point, sobre o papel de cada um dos atores que compõem o Sistema de garantias de direitos da criança e do adolescente, fazendo uma comparação e sistematização entre as diferentes competencias.
13.
CONCLUSÃO A leitura dos textos indicados para o Encontro II da disciplina de Direito da Criança e do Adolescente possibilita um entendimento geral sobre a disciplina. A atividade de resumí-los obriga um esforço de síntese onde a eleição dos temas, conceitos, princípios e ações principais é uma inevitável consequência para quem pretende se esmerar na defesa e conhecimento dos direitos dessas pessoas que se encontram em situação peculiar de desenvolvimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90) que resultou de um grande esforço de abertura e adaptação doutrinária que as diferentes visões sobre crianças e adolescentes traziam. A educação, proteção e garantia de direitos nos instrumentos legais anteriores não viam nas pessoas com idade entre 0 e 18 anos a condição de sujeito histórico de luta, proteção, garantia e posse de direitos próprios. Conhecer o marco legal internacional que orientou e orienta as diferentes visões por trás das normativas nacionais é de fundamental importância, até mesmo para compreender o que consta e o que obsta nossa Carta Magna e o que se apresenta como princípios orientadores para a legislação especial, o ECA. A Doutrina da proteção integral por parte do Estado, Sociedade e famílias; os princípios da prioridade absoluta, da observância do estado peculiar de desenvolvimento da criança e do adolescente, do melhor interesse dessas pessoas, da prevenção, e da observância de suas condições de sujeitos de direitos e sujeitos históricos nos asseveram um modo peculiar e certeiro na sua defesa e garantia, como operadores e operadoras do direito. Não há caminho a inventar. A supremacia dos direitos fundamentais da pessoa humana e a prioridade absoluta na garantia desses direitos para crianças e adolescentes são indicação do modelo de sociedade e cultura que queremos legar e nas quais queremos ver desenvolvidos os adultos do amanhã: em uma cultura e sociedade de paz e de vigência de direitos humanos, diversa, plural e equitativa. Além disso, a visão de que pessoas de 0 a 18 anos são sujeitos desses direitos, e que, portanto, precisam que eles lhes sejam garantidos, protegidos especialmente e tutelados, distancia-nos daquele modo de agir e pensar baseado na doutrina da situação irregular em que a lei era aplicada para crianças e adolescentes no caso do Código de Menores, uma normativa restrita, mas vista por todos como especial e extensiva. É nisso que devemos nos basear quando enfrentamos as violações de direitos fundamentais: direito a vida, a liberdade, direito de ir e vir, direito à convivência familiar e comunitária de direitos sociais: acesso a alimentação, moradia, saúde, lazer, escola, segurança pública e uma vida sem violência e maus tratos, assim como o absoluto direito de viver a idade peculiar de crescimento em que estão, na qual precisam de carinho, proteção, educação, cultura e principalmente não serem vistos como adultos em miniatura e sofrerem as sanções da sociedade desigual e institucionalmente violênta que obriga crianças e adolescentes ao trabalho para sustentarem seus lares e famílias e obrigam-nos a conviverem cotidianamente com a violência estrutural.
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